terça-feira, 12 de maio de 2009

Património como meio sustentável para a cidade (*)

Quando falamos de património, estamos, geralmente, a invocar uma memória do passado, que nos remete para um tempo, para uma vivência culturalmente diferente da actual. Por isso, se visitarmos as grutas de Lascaux, imaginamos como viveriam os homens na Pré-história, fazendo, de forma rude, os seus instrumentos e atacando os animais de grande porte, numa verdadeira batalha pela sobrevivência.

Ao visitarmos o Coliseu em Roma, entramos num imaginário de imperadores, legiões e gladiadores. Somos capazes de imaginar como seriam aquelas digladiações e como se moveria o polegar do imperador a dar indicação de vida ou de fim de combate.
Também nos sentimos transportados pelo tempo ao visitar o castelo de Warwick, em Inglaterra. Aí parece que respiramos o tempo dos combates entre cavaleiros, imaginamos invasões pelas muralhas do castelo, após transpor o fosso.

Esta é uma das funções do património. Contextualizarmo-nos à época, saber como os homens transpunham as dificuldades e viviam o seu dia-a-dia. E, com certeza, que isto nos ajuda a perceber o nosso presente e a delinear estratégias para o futuro.
Mas após aquilo que descrevemos em cima, acreditamos que o Património tem uma outra função igualmente importante. O Património pode incentivar um indústria que pode gerar recursos financeiros, se bem pensados e geridos. É usual, ao visitar um país ou cidade diferentes, planear os percursos e visitas. Gerir o tempo para poder ver o monumento A, B e C e ter tempo para passar por alguns Museus, jantar num restaurante típico de uma praça monumental, ou ir passear até ao Parque da Cidade que tem um monumento que atrai muitos turistas. Isto é aquilo que usualmente fazemos quando viajamos…vamos fruir das heranças culturais de outros países, e temos gosto em ver monumentos, ruas, edifícios, museus, peças móveis de extrema beleza. E será que sabemos apreciar aquilo que é nosso? Quantas pessoas conhecem os estilos arquitectónicos da Sé de Braga, ou sabem quem projectou as maravilhosas escadas temáticas do Bom Jesus? Quantas pessoas sabem que as Sete Fontes são obra de arcebispos, ou que no lugar do Novo Estádio Municipal existia um povoado da Idade do Ferro, conhecido como Castro Máximo? E quantas pessoas sabem que a Casa das Goladas tem figuras de Reis de Portugal pintadas na clarabóia?

Há falta de divulgação dos nossos monumentos ou sítios de interesse, e se nós não conhecemos, é-nos difícil gostar e defender as nossas raízes culturais. Se nós não conhecemos, não saberemos divulgar e, assim, dificilmente promoveremos a indústria do património e, por associação, o turismo. E é isso que faz falta ao nosso país, divulgar o que temos de melhor, aquilo que marca a diferença entre o nosso país e os outros, dando lugar a uma partilha de conhecimento e informação a quem nos visita.
O património, em Braga, tem sido maltratado, porque é visto como um retrocesso na evolução da cidade. Não concordamos com esta postura, por tudo o que já expusemos anteriormente, porque poderíamos marcar a diferença, porque poderíamos incrementar o conhecimento sobre a História da Cidade de Braga e transportar as pessoas a um imaginário passado, potenciando o presente e podendo planear o futuro com mais coerência.

Contudo, Braga tem privilegiado as novas construções, tem promovido a expansão da cidade. Não somos contra isto, porque é óbvio que a cidade tem de estar preparada para os desafios que são lançados constantemente, contudo, creio que faz falta haver um planeamento ordenado que promova esta simbiose…o passado e o futuro, de uma forma sustentada e sustentável.

E a postura de que Braga está a construir novo património é falaciosa (lembramos o caso do Novo Estádio Municipal). Não se pode concordar em construir um estádio de milhões, que raramente as pessoas acorrem até ele (dizem-no desconfortável), destruindo os vestígios do Castro Máximo. Ainda por cima, a estratégia de marketing do Sporting Clube de Braga passa por vestir os jogadores de Soldados Romanos. É um aproveitamento inteligente, de uma situação que lesou, claramente, o património de Braga.

Assim, perdemos potencial de concorrência com outras cidades, assim dificilmente atingiremos valores turísticos de alto índice. E nós precisamos que haja turismo, tendo em conta que o centro da cidade de Braga está tão descaracterizado, porque as fachadas estão a ser alteradas e os conteúdos internos das casas arrasados; não tem comércio tradicional (ou tem raros exemplos); tem poucas zonas de interesse histórico abertas ao público; os serviços comerciais são standardizados à escala mundial (falamos de grande superfícies comerciais onde estão representadas marcas que também estão presentes noutros países), não havendo produtos “únicos” representativos de Braga. E a breve prazo pagaremos a factura do desrespeito que temos pelas nossas heranças passadas. Um centro urbano deserto, sem pessoas…
Pugnamos por mais incentivos para o património, como marca única de Braga, para que saibamos amar o que é nosso, promovamos a fixação populacional em Braga e demos condições para gerar empregos através de uma área que ainda não está saturada – o turismo pelo património.

(*) Ricardo Silva, arqueólogo e coordenador-geral da JovemCoop (Jovem Cooperante Natureza/Cultura).

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